Três décadas se fazem presentes hoje em minha vida. Numa história onde o acaso me pregou muitas peças e o tempo foi meu fiel companheiro. É incrível o que esse amigo faz com as pessoas, com as coisas, com o tudo. Antes tínhamos o caos, hoje o universo. Antes éramos apenas átomos, hoje homens. Antes estávamos fetos, hoje adultos. Antes eu não aprendia hoje eu entendo. Antes menina, hoje mulher.

E o antes foi cheio de acontecimentos. Vivi tanto amor e tanta dor que uma página não daria para contar.  A dor me doutrinou a ser forte e correr em busca da cura. O amor me ensinou que chorar pode levar a dor no rio de lágrimas. A dor me educou em trinta anos que ser racional pode fazer tudo ficar mais amoroso. E o amor me instruiu que racionalizar faz tudo ficar menos doloroso. A dor e o amor, enfim, ensinaram-me que o tempo transforma e amadurece as passagens. E o tempo me mostrou que a vida é fluida, ela corre, muda, assim como um rio que traz águas novas sempre que passa por debaixo da ponte.

Então, de por cima da ponte, vejo a minha vida correr como um rio. Ela leva todo meu passado para a desembocadura, ao mar. E, assim, se olho para trás é apenas para lembrar que houve um passado, porque esquecer o que se foi não é de fato o melhor remédio. Fazer questão de apagar da memória os acontecimentos ruins não cura os traumas, não apaga angústias, apenas transforma o que está contido em pura amargura. A retenção não aceita que somos livres para viver, ela nos deprime e não nos permite sorrir… É uma prisão que nos mata, não nos deixa pular da ponte para correr com o rio.

Eu escolhi ser livre. Durante trinta anos escolhi uma vida para ser livre de todos meus medos, de todas minhas torturas. Assim, sempre, mesmo quando tenho pesadelos, eu sou capaz de acordar e sorrir! E sorrio, mesmo não tendo terminado uma infância. E livremente gargalho, brinco, corro, conto piadas. Sim! Sim!!! Gracejo de tudo!!! Porque estou vivendo essa meninice agora e não me sinto pior por isso. Não sou menos mulher por caçoar, por sorrir, por gostar das coisas simples. Sou muito mulher! E, ainda, confesso, sem modéstia, que sou muito boa em ser fêmea. Um animal do sexo feminino de 30 anos, que goza, que chora, que ri, que rodopia e que vive a liberdade de ser feliz!

Só se aprende essa liberdade com as crianças. Não digo o aprendizado das birras, das desobediências e das inconsequências. Sim, porque a imaturidade não cabe em uma vida fluida, ela de fato estagna o correr dos acontecimentos. Devemos aprender que existem coisas maravilhosamente simples e prazerosas que nos dão felicidade. Bem, talvez eu ainda esteja aprendendo, com dor e com amor, que quanto mais vermos de forma simples as coisas boas da vida, melhor será ter passado por ela. Quanto mais olharmos para as soluções e menos para os problemas, mais viveremos de forma suave. Quanto mais brincarmos, mais nos tornaremos meninos, e quanto mais meninos, mais nos tornaremos adultos melhores.

Hoje, então, com trinta anos, eu ainda aprendo. E vou aprender mais com esse amigo tempo que muda tudo. Que amadurece, transforma as preferências e as escolhas. Porque nesse tempo eu prefiro um amor tranqüilo a uma paixão ensandecida. Nesse tempo escolho trabalhar com pouco dinheiro a enlouquecer com a ambição alheia. Com trinta eu prefiro zombar que ficar carrancuda. Com trinta prefiro gozar a ter que me reprimir. Nesse tempo, com trinta, eu prefiro ser um pouco menina e mulher. Porque antes fui menina com cabeça de mulher. Hoje, então, sou mulher com jeito de menina.

 

Por Rebeca Barreto – 17 de fevereiro de 2012