Foto: Flávio Carneiro

Tudo começou em setembro passado, num daqueles domingos chuvosos em que a gente fica em casa meio deprimido, sem ter o que fazer… Estávamos Flávio (Carneiro) e eu conversando, quando ele vira pra mim e diz que tem uma proposta a me fazer… Falei pra ele: “manda”… E ele pergunta se eu não queria ir com ele escalar no Chile, em dezembro. Ele iria fazer um curso do Greenpeace por uma semana, e eu poderia encontrá-lo ao final do curso e dali desceríamos para escalar na região de Cajon de Maipo. Em poucos segundos, a única coisa que me veio à cabeça foi: eu não tinha férias há 12 anos… Isso fez com que a resposta viesse quase imediata… “Proposta aceita!”

Durante os meses que se seguiram, saí correndo atrás de preço de passagem, pesquisei inúmeros hotéis, cabanas, campings, descobri uma página que tem todas as vias de escaladas do Chile, desde paredes, falésias, gelo e tradicionais – e que vale ter nos “ favoritos”, anotem aí: www.escalando.cl ou  www.escalando.org

E assim fomos escolhendo os locais que ficavam mais perto de Santiago, e que tinham o tipo de escalada de que mais gostamos: vias mais longas, vias em móvel etc. Decidimos levar todo o equipamento para camping, embora ainda não tivéssemos certeza se iríamos ou não acampar e, com todos os preparativos, os meses voaram.


Foto: Flávio Carneiro

Logo dezembro chegou e o Flávio partiu, uma semana antes que mim. O curso que ele foi fazer era em Concon, cidade de praia próxima a Viña Del Mar e era lá que eu deveria me encontrar com ele. Saí do Rio no dia 9, à noite, cheguei em Santiago às 3h da manhã e fui para um hotel. No dia seguinte, parei na locadora em que eu tinha reservado um carro e peguei a estrada rumo a Concon… Senti uma sensação muito boa estando ali, dirigindo sozinha naquela estrada, num país que eu nunca tinha estado antes, indo rumo a uma pequena, mas emocionante viagem.

Os primeiros dias que passei em Concon foram mais de descanso, praia, piscina… e logo chegou a hora de partimos para as escaladas, após o término do curso do Flavio. Dormimos uma noite em Santiago e, no dia seguinte, seguimos para Cajón del Maipo. Esta região está a uma hora de Santiago, tem uma altitude de aproximadamente 1.250m e fica um pouco distante das montanhas mais altas. Escolhemos para hospedagem um dos hotéis que havíamos pesquisado, na cidade de San Alfonso (a 10 km de San Jose del Maipo). Logo no primeiro dia fizemos amizade com o casal que toma conta do hotel, o que nos valeu uma boa conversa à noite, com a promessa de, na manhã seguinte, eles nos apresentarem ao Ricardo, amigo deles e guia local de escaladas.

Dormimos com aquela sensação de que o dia seguinte prometia… e foi o que aconteceu. Logo cedo partimos para buscar o Ricardo na cidade, e ele nos levou para conhecer San Gabriel. San Gabriel (a 10 km do hotel) é o paraíso das fendas: são blocos e mais blocos enormes de pedra, com fendas por todos os lados. Nossa primeira escalada nos rendeu seis enfiadas inteirinhas feitas em móvel… o único piton da via, o Flávio fez o favor de pular… O lugar é tão grande que a gente nunca faz cume — ou seja, você escala duas enfiadas, pensa que chegou a um lugar e aparecem mais duas, você faz mais essas duas e lá surgem outras… Não acaba nunca! Portanto, decidimos manter como meta nos nossos dias de escalada o horário das 18 horas para o início dos rapéis, onde quer que estivéssemos.


Fotos: Adriana Mello

Por não existirem grampos, os rapéis são sempre delicados, ora em bico de pedra, ora em árvore, e o abandono de fitas e cordeletes é uma constante. Como já estávamos preparados para isso, levamos muito material extra pra garantir qualquer eventualidade e poder mesmo abandonar. A adrenalina de descer sempre com duas cordas (também muito importante nesse local), presos nessas pedras e árvores, em geral só acabava quando estávamos de volta à base. As trilhas não são longas, mas é necessário ter cuidado, pois o tempo inteiro você está andando em pedras soltas, seja no início ou quando começam as subidas…

A temperatura para escalar nessa época do ano é ideal. Usando uma camiseta sem manga ou com manga curta você passa o dia inteiro sem sentir calor nem frio. O sol só se põe depois das 21h; com isso, podíamos escalar num horário de meio-dia às 20h, sem nunca ter usado as lanternas de cabeça. As fendas são próprias tanto pra friends quanto nuts e é importantíssimo levar o saca-nuts, porque as colocações em geral são tão perfeitas que eu diria que em 95% das vezes precisei desse auxílio.

A graduação das vias que fizemos girava em torno de um 5º por serem sempre bem verticais e em algumas delas apareciam alguns lances de 6°, e uma ou outra vez de 7°.

Os chilenos são um povo muito amável e hospitaleiro. Devido a essa amizade que fizemos por lá, tivemos como presente um churrasco com direito a seresta chilena, oferecido para nós na casa deles, mais almoço de despedida, e até um passeio a uma cidade do interior para assistir a um rodeio típico da região.

Nos sete dias que passamos nessa região pudemos conhecer também um local de falésias, chamado Palestras de Manzanno. Às vezes tínhamos que intercalar um dia de escalada muito longa com outras menores para poder descansar um pouco. Voltamos a San Gabriel mais três vezes, fazendo vias diferentes, e posso afirmar que vale a pena conhecer a região. Com certeza, assim que pudermos, vamos voltar!

Adriana Mello – Dezembro de 2005
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